Entrevistas
Nessa entrevista ao Clube de Jazz, o pianista Marvio Ciribelli, que está lançando o cd "Theo e seu Tio - 10 anos depois", nos conta um pouco da sua trajetória musical, desde a sua formação até os últimos trabalhos e também sobre os seus futuros projetos.
Marvio Ciribelli com Thaís Motta, Daniela Spielman, Antônio Adolfo e Milena Ciribelli. Cds: Theo e seu Tio - 10 anos depois, Ao Vivo com Aditivo e Fazendo o que gosta.
04/10/2011 - Wilson Garzon
Wilson Garzon - Em sua formação jazzística foi importante estudar com Luiz Eça e Antônio Adolfo?Marvio Ciribelli - O Antônio Adolfo me mostrou realmente qual a diferença entre ser um pianista popular moderno e ser um pianista que apenas aplica a técnica aprendida no estudo erudito na parte popular. Mostrou uma diferença muito grande. Já o Luiz Eça mostrou como usar a técnica erudita a favor da música popular. Outro grande mestre, o Ian Guest mostrou como eu poderia organizar tudo isso na cabeça e no papel. Nos estudos com todos os três grandes mestres, o jazz esteve presente, sempre enfatizando e indicando os caminhos da liberdade de expressão, tanto tocando como arranjando. Isso tudo sem destacar a incrível força e "conhecimento de causa" que os três sempre demonstravam quando lidavam com a Bossa Nova, prima irmã do Jazz.
WG - Conte um pouco sobre sua primeira banda "Arte Final". Um misto de loucura e ousadia?
MC - Foram cinco jovens músicos de formações e personalidades totalmente distintas que descobriram como trabalhar em grupo, entendendo as idéias dos companheiros e ainda... como crescer com a música. Após o final do grupo, alguma loucura ficou comprovada pois os seus integrantes partiram para caminhos completamente diferentes, cada qual levando a nova "bagagem". Eu imediatamente passei a assinar o meu trabalho. O baixista Sérgio Nacif em poucos anos se tornou tecladista. O Giovanni Bizzoto destacou ainda mais o seu lado compositor. O Renato Franco, saxofonista e flautista preferiu continuar sua carreira de "sideman", acompanhando os artistas famosos (Ivan lins, Lucinha Lins, Leila Pinheiro, Marcos Valle) e o baterista Rocyr Abbud continuou a se destacar pela técnica.
A ousadia maior foi a de levar a sério todos os estudos feitos por cada membro, tentado aplicá-los ao máximo nos arranjos e performances. Chagamos até ao absurdo (no bom sentido) de experimentar sambas em 7 e rocks em 5 quando as pessoas estavam dançando em nossos bailes... rs rs rs... Algumas vezes, eu considerei maldade nossa... Durante um show em praça pública em Cantagalo, numa festa da cidade, mostramos para nós mesmos que, quando a música é feita com cuidado, carinho, técnica e disposição, pouco importa o gênero, o número de notas ou o compasso... Aos poucos, notávamos que a multidão que lotava a praça ia tentando entender a música, dançando e cantando... começando de forma tímida mas percebendo que, o prazer de tocar que mostrávamos no palco estava contagiando a todos...
WG - A seu lado compositor já estava presente em seu primeiro cd? E o lado arranjador também?
MC - Eu sempre priorizei as mínhas músicas nos meus trabalhos gravados. Sobre os arranjos, eu preparava alguma coisa em casa (principalmente a harmonia), mas na hora dos ensaios e gravações, sempre procurava ouvir as idéias dos músicos que estavam comigo. Eu acho que esse procedimento amplia os horizontes e reforça os bons resultados.
WG - O seu cd "Fazendo o que gosta" é também um tributo aos amigos que tocam com você?
MC - "Fazendo o que gosta" foi um projeto que durou mais de 2 anos e que trouxe gente de todos os cantos do mundo, atraídos pela informação que lá, o músico só tocava o que gosta de tocar... Os "jazzistas" do grupo de rock holandês Focus, vieram uma noite para ver o que rolava... Gostaram tanto que voltaram várias vezes. E além de tocarem seus "sucessos" (Hocus Pocus, Sylvia, House of the King, Focus III, etc) tocaram (e muito bem) uma série de "jazz standards", o que incluía temas de Miles Davis e Duke Ellington. Quando o projeto acabou, resolvi homenageá-lo (e a todos que dele participaram) com este cd. Para mim, o lema é o seguinte: Quando você faz o que gosta, faz melhor...
WG - E como foi a história do seu cd, “Ao Vivo com Aditivo”?
MC - As gravações originais foram feitas no Montreux Jazz Festival, na Suíça em 1994, um ano após a primeira apresentação no festival. Como eu havia acabado de lançar o cd do show de 93, deixei o material ficando numa fita dat por 11 anos. Outro motivo de não lançar logo o cd foi que eu achava essencial a participação do trombonista Paulo Williams, que fazia parte de banda e não pode participar dessa segunda (e inesperada) excursão a Montreux, pois estava em turnê pela Europa com Gal Costa. No início de 2005, convidei Paulo Williams a gravar todos os arranjos da época e com o auxílio do Pro-Tools e de um excelente técnico, o Fábio Henriques, que na época trabalhava no Discovery Studio, acertamos o som e equilibramos com as novas gravações. Daí veio o nome “Ao vivo com Aditivo”.
As novas gravações não descaracterizaram em nada a performance do grupo, mantendo toda a sensação de show ao vivo. O grande mérito do cd é sempre dar a sensação de estar acontecendo "ao vivo" enquanto se ouve. Além, do "aditivo" Paulo Williams, o grupo que gravou o cd em Montreux era formado por Rocyr Abbud (bateria), Gláucio Martins (saxofone), Jakaré (percussão) e Rogério Fernandes (baixo) que e é o único membro original do grupo, presente com muita freqüência nos meus shows de hoje.
WG - Como foi a emoção de tocar em Montreux?
MC - Eu me senti extremamente recompensado por todo o estudo e trabalho feito até então. O festival é freqüentado por gente de todos os paises e podia notar fácil fácil, o quanto a música brasileira agrada ao estrangeiro. Especialmente quando se procura tocar tocar de forma livre, isto é, jazzistica... Todos ficam ainda loucos, querendo entender o como improvisamos a partir de idéias rítmicas desse país. O festival facilita em tudo a gravação ao vivo. Eles não são bobos e sabem que quanto mais discos forem gravados no festival, maior será a divulgação que eles terão e mais prestígio eles conseguirão.
WG - O que te levou a relançar o cd "Theo e seu Tio", lançado em 2002? Houve mudanças?
MC - Eu considero este CD como sendo o meu melhor trabalho gravado mas, dez anos após o lançamento, "achei" coisas que gostaria de fazer de forma um pouco diferente e percebi que poderia fazer algumas modificações sem alterar a essência mas... inserindo a minha visão atual sobre meu próprio trabalho. Isso resultou na inclusão de novos detalhes de percussão, "camas" de violoncelo, de solos de sax, flauta, flugel, trompete e piano, nova presenças de Chico Oliveira (trompetista do sexteto do Jô), Fábio Cavalieri e Francisco Falcon (contrabaixistas), Flavinho Santos (percussão) e Marcelo Martins (saxofonista e flautista) e obviamente, novas mixagens para as músicas que mexi. Nada como ouvir um trabalho que tanto gosto, renovado, dez anos depois.
WG - Em que projetos está trabalhando para os próximos anos?
MC - Algum tempo atrás, gravei com músicos holandeses do grupo Focus (Thijs Van leer, Pierre van der Linden e Bobby Jacobs) e os brasileiros Márcio Bahia, Rogério Fernandes, Thaís Motta, Arthur Maia, Mário Sève e David Gang. E ainda o holandês Jan Dumée que tb fez parte do grupo. Estou mixando este trabalho para lançar em pouco tempo. Será uma conexão Brasil Holanda. Vale dizer o Focus é um dos melhores grupos de Rock dos anos 70 e todos tocam jazz muito bem além de terem uma harmonia super interessante. Outra caracteristica é que quase todas as músicas foram gravadas com dois bateristas tocando ao mesmo tempo (Bahia e Pierre). Está virando um discão!!! Depois... virão novos trabalhos de Thaís Motta e Márcio Lott.
WG - Como você avalia a atual cena instrumental brasileira e carioca?
MC - Acho que, como sempre, aparecem novos talentos na cena. E também, como sempre (especialmente no Rio de Janeiro), vão diminuindo os espaços para se fazer música boa… Uma pena, especialmente para um pais de tanta riqueza musical. Se a gente procurar (tem que procurar), achamos novos CDs e trabalhos interessantes… mas não temos facilidade nenhum em conhece-los… É bom ganhar dinheiro sim, concordo…mas sinceramente, muito melhor é ganha-lo, fazendo o que se gosta. Eu penso assim!
Contatos
www.marviociribelli.com.br
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